SÃO PAULO (Reuters) - Recorrendo mais uma vez à magia que inspirou alguns de seus melhores roteiros, como "A Rosa Púrpura do Cairo" e "Simplesmente Alice", e sem por isso chegar à ficção científica, Woody Allen elege o improvável Owen Wilson como o passageiro de uma viagem no tempo, rumo aos inquietos anos 1920 em sua nova e deliciosa comédia, "Meia-Noite em Paris", que abriu o último Festival de Cannes.
Transformar Wilson, ator de algumas comédias muito duvidosas, como a recente "Passe Livre", no intérprete convincente desta história criativa, aliás, foi a primeira mágica do diretor.
Na pele do roteirista Gil Pendler, cujo sonho é trocar Hollywood pela literatura, o ator assume seu costumeiro ar entre ingênuo e abobado, que cai bem, no entanto, a um personagem que descobre por acaso uma porta fantástica no tempo, que lhe permite trocar figurinhas com uma lista invejável de alguns dos maiores artistas da História. Entre eles, Scott e Zelda Fitzgerald (Tom Hiddleston e Alison Pill), Ernest Hemingway (Corey Stoll), Gertrude Stein (uma impagável Kathy Bates), Pablo Picasso (Marcial Di Fonzo Bo), Henri Matisse (Yves-Antoine Spoto) e Salvador Dalí (uma breve e inspirada participação de Adrien Brody).
A porta mágica fica dentro de um calhambeque Peugeot, no qual Gil embarca numa noite em que se perdeu pelas ruas de Paris -- depois de deixar a noiva Inez (Rachel Adams) sair com outro casal de amigos, em que um deles é Paul (Michael Sheen), um pseudo-intelectual pedante que Gil simplesmente não aguenta mais ver pela frente.
Cabe a ninguém menos do que a primeira-dama francesa, Carla Bruni, abalar a pose de Paul, bem no momento em que ele montava um discurso com algumas imprecisões sobre a vida de Auguste Rodin. Carla interpreta a guia do museu da obra do célebre escultor, um dos locais mais belos de Paris, e tem três cenas no filme, duas ali mesmo e outra num banco diante da catedral de Notre-Dame.
Para quem ama Paris, como o diretor e a maioria da humanidade, o filme é um prazer desde as primeiras sequências, que percorrem alguns dos pontos cardeais da paisagem afetiva da cidade que já foi descrita como uma festa. Esse foi o título aliás, de um livro do próprio Hemingway, um dos expatriados americanos em Paris que participam ativamente da fantasia viva de Gil.
É numa personagem fictícia, no entanto, Adriana (Marion Cottilard), musa de Picasso, que o filme sintetiza a fantasia romântica que abala Gil mais profundamente, levando-o a reavaliar seu noivado com Inez -- a quem cabe, o tempo todo, a função de desmancha-prazeres do noivo sonhador.
Nenhum elemento desta boa receita funcionaria, no entanto, sem um equilíbrio entre a beleza, a poesia, o humor e umas pitadas de discussão sobre o sentido da vida, de estarmos aqui, nesta época, sonhando sempre com outra, geralmente no passado e que idealizamos o bastante para acreditar que foi melhor.
Brincando com essa ideia simples, embalada em várias músicas de Cole Porter, "Meia-Noite em Paris" soa afinado como um violino e nunca esquece de fazer sorrir. Às vezes, faz rir muito das piadas com um perfume intelectual, nada pedante, que Woody sempre soube fazer tão bem. Continuação...
Transformar Wilson, ator de algumas comédias muito duvidosas, como a recente "Passe Livre", no intérprete convincente desta história criativa, aliás, foi a primeira mágica do diretor.
Na pele do roteirista Gil Pendler, cujo sonho é trocar Hollywood pela literatura, o ator assume seu costumeiro ar entre ingênuo e abobado, que cai bem, no entanto, a um personagem que descobre por acaso uma porta fantástica no tempo, que lhe permite trocar figurinhas com uma lista invejável de alguns dos maiores artistas da História. Entre eles, Scott e Zelda Fitzgerald (Tom Hiddleston e Alison Pill), Ernest Hemingway (Corey Stoll), Gertrude Stein (uma impagável Kathy Bates), Pablo Picasso (Marcial Di Fonzo Bo), Henri Matisse (Yves-Antoine Spoto) e Salvador Dalí (uma breve e inspirada participação de Adrien Brody).
A porta mágica fica dentro de um calhambeque Peugeot, no qual Gil embarca numa noite em que se perdeu pelas ruas de Paris -- depois de deixar a noiva Inez (Rachel Adams) sair com outro casal de amigos, em que um deles é Paul (Michael Sheen), um pseudo-intelectual pedante que Gil simplesmente não aguenta mais ver pela frente.
Cabe a ninguém menos do que a primeira-dama francesa, Carla Bruni, abalar a pose de Paul, bem no momento em que ele montava um discurso com algumas imprecisões sobre a vida de Auguste Rodin. Carla interpreta a guia do museu da obra do célebre escultor, um dos locais mais belos de Paris, e tem três cenas no filme, duas ali mesmo e outra num banco diante da catedral de Notre-Dame.
Para quem ama Paris, como o diretor e a maioria da humanidade, o filme é um prazer desde as primeiras sequências, que percorrem alguns dos pontos cardeais da paisagem afetiva da cidade que já foi descrita como uma festa. Esse foi o título aliás, de um livro do próprio Hemingway, um dos expatriados americanos em Paris que participam ativamente da fantasia viva de Gil.
É numa personagem fictícia, no entanto, Adriana (Marion Cottilard), musa de Picasso, que o filme sintetiza a fantasia romântica que abala Gil mais profundamente, levando-o a reavaliar seu noivado com Inez -- a quem cabe, o tempo todo, a função de desmancha-prazeres do noivo sonhador.
Nenhum elemento desta boa receita funcionaria, no entanto, sem um equilíbrio entre a beleza, a poesia, o humor e umas pitadas de discussão sobre o sentido da vida, de estarmos aqui, nesta época, sonhando sempre com outra, geralmente no passado e que idealizamos o bastante para acreditar que foi melhor.
Brincando com essa ideia simples, embalada em várias músicas de Cole Porter, "Meia-Noite em Paris" soa afinado como um violino e nunca esquece de fazer sorrir. Às vezes, faz rir muito das piadas com um perfume intelectual, nada pedante, que Woody sempre soube fazer tão bem. Continuação...
Nenhum comentário:
Postar um comentário