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17 de jun. de 2011

ESTREIA-Woody Allen faz viagem no tempo em 'Meia-Noite em Paris'

SÃO PAULO (Reuters) - Recorrendo mais uma vez à magia que inspirou alguns de seus melhores roteiros, como "A Rosa Púrpura do Cairo" e "Simplesmente Alice", e sem por isso chegar à ficção científica, Woody Allen elege o improvável Owen Wilson como o passageiro de uma viagem no tempo, rumo aos inquietos anos 1920 em sua nova e deliciosa comédia, "Meia-Noite em Paris", que abriu o último Festival de Cannes.



Transformar Wilson, ator de algumas comédias muito duvidosas, como a recente "Passe Livre", no intérprete convincente desta história criativa, aliás, foi a primeira mágica do diretor.

Na pele do roteirista Gil Pendler, cujo sonho é trocar Hollywood pela literatura, o ator assume seu costumeiro ar entre ingênuo e abobado, que cai bem, no entanto, a um personagem que descobre por acaso uma porta fantástica no tempo, que lhe permite trocar figurinhas com uma lista invejável de alguns dos maiores artistas da História. Entre eles, Scott e Zelda Fitzgerald (Tom Hiddleston e Alison Pill), Ernest Hemingway (Corey Stoll), Gertrude Stein (uma impagável Kathy Bates), Pablo Picasso (Marcial Di Fonzo Bo), Henri Matisse (Yves-Antoine Spoto) e Salvador Dalí (uma breve e inspirada participação de Adrien Brody).

A porta mágica fica dentro de um calhambeque Peugeot, no qual Gil embarca numa noite em que se perdeu pelas ruas de Paris -- depois de deixar a noiva Inez (Rachel Adams) sair com outro casal de amigos, em que um deles é Paul (Michael Sheen), um pseudo-intelectual pedante que Gil simplesmente não aguenta mais ver pela frente.

Cabe a ninguém menos do que a primeira-dama francesa, Carla Bruni, abalar a pose de Paul, bem no momento em que ele montava um discurso com algumas imprecisões sobre a vida de Auguste Rodin. Carla interpreta a guia do museu da obra do célebre escultor, um dos locais mais belos de Paris, e tem três cenas no filme, duas ali mesmo e outra num banco diante da catedral de Notre-Dame.

Para quem ama Paris, como o diretor e a maioria da humanidade, o filme é um prazer desde as primeiras sequências, que percorrem alguns dos pontos cardeais da paisagem afetiva da cidade que já foi descrita como uma festa. Esse foi o título aliás, de um livro do próprio Hemingway, um dos expatriados americanos em Paris que participam ativamente da fantasia viva de Gil.

É numa personagem fictícia, no entanto, Adriana (Marion Cottilard), musa de Picasso, que o filme sintetiza a fantasia romântica que abala Gil mais profundamente, levando-o a reavaliar seu noivado com Inez -- a quem cabe, o tempo todo, a função de desmancha-prazeres do noivo sonhador.

Nenhum elemento desta boa receita funcionaria, no entanto, sem um equilíbrio entre a beleza, a poesia, o humor e umas pitadas de discussão sobre o sentido da vida, de estarmos aqui, nesta época, sonhando sempre com outra, geralmente no passado e que idealizamos o bastante para acreditar que foi melhor.

Brincando com essa ideia simples, embalada em várias músicas de Cole Porter, "Meia-Noite em Paris" soa afinado como um violino e nunca esquece de fazer sorrir. Às vezes, faz rir muito das piadas com um perfume intelectual, nada pedante, que Woody sempre soube fazer tão bem. Continuação...

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